23/09/2012

Entrevista com Patrícia Pillar: a Constância de Lado a Lado

Patrícia Pillar volta às novelas como a ex-baronesa Constância, de "Lado a Lado". Em entrevista, a atriz fala da emoção que sente com cada personagem e como ama fazer trabalho de época Aos 48 anos de idade, sendo mais de 30 deles dedicados às artes, a atriz Patrícia Pillar se consagrou por interpretar papéis de destaque na TV e também po...r sua garra e coragem ao revelar, no ano de 2002, que estava com câncer nos seios. Na época, a atriz usou seu drama pessoal para alertar outras mulheres sobre a importância de fazer o autoexame dos seios. Depois de um tempo afastada das novelas – o último trabalho foi A Favorita e participações especiais – Patrícia volta à cena mais uma vez com uma personagem de peso, a ex-baronesa Constância. Durante coletiva de imprensa de Lado a Lado, ela falou sobre a emoção que sente sempre que começa um novo trabalho, sobre a nova personagem, traição, amor, entre outros assuntos. Confira na entrevista a seguir: Como está sendo para você fazer esse novo trabalho? É muito bom poder rever a nossa história, olhar por outros ângulos. Aquela era uma época para o Rio de Janeiro. Foi quando surgiu o futebol, o samba. Temos aí um material muito rico, diferente. Parece que a Constância será a grande vilã da história. Quanto à Constância ser a grande vilã da história, eu não sei. Não cabe a mim dizer isso, pois existem personagens muito bons. Pelo clipe, deu pra ver que todos foram muito bem construídos e é isso que importa para uma história dar certo. Quando faz o público se envolver com cada personagem, porque tem vários núcleos interessantes. Para a coisa dar certo é preciso ter assunto. Tem o que ser dito e é isso que faz uma novela. Parece que a Constância carrega um pensamento atrasado, de uma época que passou. Como a Patrícia, que é uma mulher moderna, vê isso tudo? Na verdade, o interessante nisso tudo é que a Constância pensa de uma maneira que você vê gente pensando até hoje. Nos dias atuais, tem muita gente que pensa como a Constância. A novela fala muito do nascimento da mulher moderna. Tem uma filha da aristocracia e uma filha do povo, representando esse olhar para o futuro, esse olhar que gerou a mulher dos dias de hoje. Ao mesmo tempo, a Constância, também, representa o nascimento de uma parte da nossa elite, não toda, mas uma parte. A parte que é egoista, que não tem nenhuma sensibilidade social, que a gente sabe que existe. Muita gente conhece gente assim e sabe que estas pessoas estão aí até hoje. São pessoas que querem resolver tudo nas internas. Como você acha que a novela vai contribuir para passar algo da nossa história para o público? Além do que já falei, dos modelos de comportamento que a gente encontra na nossa sociedade de uma maneira geral, tem a parte cultural. Ela mostra o nascimento, ou melhor, a vinda do futebol para o Brasil, que acabou substituindo o cricket, que era o que se jogava na época. O surgimento do samba, da capoeira, do morro, da favela. Enfim, foi tudo isso que construiu a cultura que temos hoje. Dessa mistura do nosso povo. Essa novela tem muito conteúdo, tem um assunto tão rico, que acredito que seja isso que vai construir o dia a dia dos envolvidos com a produção dessa novela, os autores, atores, direção. Ter história para contar e através de personagens que representam o nosso povo, a nossa história e o nosso presente. Em que ano é passada a novela? É uma novela passada em 1903, 1904, 1910. É a fundação da sociedade que a gente tem hoje, da nossa República, dos defeitos e qualidades que a gente tem. Da mulher de hoje, com seus defeitos e qualidades. Aborda os tópicos da nossa sociedade. Então a Constância não é necessariamente uma vilã. O que ela busca? Ela luta por coisas que ela não vai conseguir mais conter, que é o pensamento da filha em relação a querer estudar e trabalhar, por exemplo, ao dizer que o casamento não é o que vai fazê-la feliz. E ela tem uma opinião contrária, viveu tudo isso de uma maneira diferente, de uma forma boa. Ela é feliz com o marido, com a família, com a visão que ela tem das coisas. Mas parece que ela vai trair o marido. Como será isso? Ela vai ter um envolvimento com o personagem do Cássio Gabus Mendes. O caso é que a Constância é uma falsa moralista. Ela é uma moralista que está a serviço de tudo, menos da moralidade, como diz o Veríssimo num dos artigos dele a respeito da moralidade, que eu adoro. Acho incrível, porque em geral o moralismo está a serviço de tudo menos da moralidade. O falso moralista então, nem se fala, é o mais inescrupuloso. O texto da novela é muito bom, tem muito conteúdo! Você disse que a Constância é feliz com o marido, com o casamento. Então, qual o motivo da traição dela? Ela é muito feliz mesmo. E é exatamente por isso que ela trai. Pela união da família. Só que isso é uma incongruência danada na cabeça dela, ela faz isso para manter a família unida, para conseguir um emprego de posição para o marido, para colocar o marido novamente no mercado de trabalho. Porque ele era um barão, um homem poderoso, de dinheiro. Então ela trai por uma troca. Seria isso? Exatamente. Para ela é tudo uma troca. E o propósito sendo esse, na cabeça dela é um propósito nobilíssimo, para o marido continuar sendo um cara importante e a família ficar bem. Você sempre gostou de fazer novela de época. Estava com saudades de fazer uma? Eu adoro, né? Essa é uma ex-baronesa, o que muda tudo. A outra baronesa que eu fiz era do campo. Eram outras questões. Essa é bem diferente. É aquela da cidade, que perdeu tudo com o fim da escravidão. Ela não tinha mais empregada, as terras se foram. É uma família em declínio financeiro e isso desestrutura completamente a família, que busca ocupar aquele espaço novamente. O que você fez para se preparar para a novela? Tivemos umas palestras para falar de História do Brasil, que foi muito legal. Foi com o Peninha, o Eduardo Bueno. Maravilhoso! Um cara que traz esse frescor do gosto pela história. Às vezes, na nossa época de aula, talvez o professor não fosse tão legal e a gente acabava achando aquele assunto chato. Mas é tão legal poder conhecer melhor, de uma forma melhor contada. Essa é a nossa história. Aconteceu praticamente “ontem”, porque não faz tanto tempo assim. E saber de tudo que aconteceu e que traz tanta mudança pra gente é tão importante. Enfim, o Eduardo Bueno fala de uma maneira que a gente fica querendo saber mais. Tivemos, também, uma aula de música, que contou sobre os ritmos e como eles foram se transformando, o choro, o maxixe, o samba, até chegar nessa música que temos hoje. Eu ainda tive um laboratório, porque a Constância é muito elegante e tudo mais. E a cabeleira? Como é a preparação para entrar em cena? Quanto tempo leva? É uma loucura! Mas é muito gostoso fazer uma caracterização de época. É bastante trabalhoso, mas não deixa de ser uma delícia. Quanto ao tempo, por enquanto, como estamos começando, as coisas demoram um pouco mais por conta dos acertos. Mas daqui a alguns dias, tudo ficará rápido. Leva em torno de uma hora e meia, duas horas. Algum cuidado especial para as madeixas? E as roupas? É muita coisa, não é? Não, porque na verdade eu uso bem pouquinho do meu cabelo. E o cuidado acaba sendo normal. As roupas é que são lindas de morrer. São muitas camadas. Tem roupa com 12 tipos de renda. É uma coisa preciosa, incrível! E aí vem a parte de baixo, o espartilho, camiseta por baixo, daí vem a anágua, por cima da anágua vêm a saia, por cima da saia vem tules, mais saias, cada coisa linda. Rendas e rendas fabricadas, que você não vê a costura. São roupas até confortáveis, nem são pesadas, são tecidos leves, acho que até para deixar a gente mais à vontade e também não tem armação, porque já não é mais da época da armação. Você está distante das novelas des-de A Favorita. O que você fez nesse período? Por que tanto tempo lon-ge das telinhas, tendo um público que adora te ver trabalhando em novelas? Fiz algumas participações, Passione, Divã, As Brasileiras. Apresentei o Vídeo Show por um ano. Acho que é isso mesmo, que o artista acaba tendo que experimentar algumas coisas diferentes, até para se experimentar. Acredito que é um processo natural participar de outras coisas. Mas meu tempo é mais lento. Processo as coisas de forma mais devagar, gosto de ter esse tempo. Tenho um projeto em mente para teatro, mas ainda é cedo para falar sobre ele. Só posso dizer que é um texto que existe, que terei que trabalhar no roteiro e que é algo que me deixa muito feliz em poder fazer. O que você acha dessa falta de privacidade que a Constância impõe aos filhos? Como você vê isso numa época em que a privacidade é algo tão polêmico? A falta de privacidade de que a gente reclama hoje começou naquela época, com a Constância (risos). Com ela não existe privacidade. Ela entra nos quartos dos filhos, mexe nas gavetas, fuça tudo. Ela ama os filhos e acha que tem todo o direito de se intrometer na vida deles. Claro que tudo isso é absurdo, mas fazer o quê? A Constância trata os filhos de formas diferentes porque um é homem e a outra é mulher? Era uma sociedade machista e ela é machista, por conta disso o tratamento do filho é diferente do tratamento da filha. Então o filho ela defende, pode tudo. Já a filha, não. E com o marido? Ela é dominadora com o marido? Nem tanto. Ela tem um jeitinho. Ela quer o que ela acha que é o certo. Brinco que ela até tem jeito de mocinha, é toda doce, se veste muitíssimo bem, tem quase tudo de mocinha, é fina, elegante. Já as mocinhas dessa novela têm a personalidade forte, são moças de muita garra e força. Sabem o que querem. Então as pessoas conseguem se ver nestes personagens porque eles são bem próximos da vida real? Os personagens servem para isso, pra gente se reconhecer ou dizer como a gente não quer ser. Essa é uma das funções da arte, da dramaturgia. Os personagens existem para que a gente reflita sobre como queremos ser, como somos e como não queremos ser.

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